Desde os tempos da faculdade que
Cuba me interessa. Um dos pontos chave desse interesse sempre foi o sistema de
saúde do país. Li muito e ouvi falar mais ainda, que se tratava do melhor do
mundo, tinha muita curiosidade em conhecê-lo de perto.
No dia 22/04, meu primeiro dia em Caimito, passeando
de bicicleta livremente pela cidade, tive a oportunidade de visitar uma
policlínica. O primeiro contato e a primeira surpresa: Não havia filas! Aliás,
havia sim, uma, com cinco pessoas para pegar remédios. Ninguém dormindo nos
corredores, ninguém esperando um médico que nunca virá.
Quarta-feira, dia 25/04, tivemos a
tão esperada conferência sobre o tema e de quebra um encontro fraterno com
médicos internacionalistas. Aí pudemos aprender um puco mais sobre as
estatísticas e a história da saúde no país. Abaixo, segue os dados apresentados
na conferência e em pesquisas históricas que eu já possuía.
O governo da Ilha, logo após a
Revolução, desenvolveu um sistema nacional de cobertura a todos os cidadãos,
sem exceções de nenhum tipo. O sistema foi dividido da seguinte maneira: o
médico de família que, geralmente, está em pequenas clinicas a cada duas
quadras, garantindo o trabalho de prevenção de doenças; o clínico geral de
bairro, como os nossos postos de saúde; os hospitais de zona e os institutos
especializados, que cuidam de traumas e/ou doenças que precisam de tratamento a
longo prazo ou têm maior complexibilidade.
Em Cuba, o governo não financia a
iniciativa privada, pois não existe hospital privado ou plano de saúde. Todo o
sistema, incluindo todo e qualquer tipo de atendimento, desde uma unha
encravada a uma cirurgia no cérebro, é gratuito. Os medicamentos que só podem
ser adquiridos com receita médica, são quase irrisórios, pois o Estado subsidia
a maior parte.
Toda a assistência odontológica é
oferecida pelo governo também.
O resultado prático de tudo isso
fica visível nas comparações efetuadas pelas Nações Unidas. Mesmo com uma
população pobre e oprimida por um bloqueio econômico genocida, Cuba ocupa hoje,
o terceiro lugar no continente americano, quando se trata da expectativa de
vida, 76 anos para os homens e 80 para mulheres com uma esperança de vida média
de 79,1 anos para o povo cubano. Quando se trata das crianças, os dados apontam
para o índice de cinco mortes a cada 1.000 nascimentos, nível comparável, na
América, apenas ao do Canadá.
Se pararmos para pensar que antes
da Revolução de 1959, existiam na Ilha, apenas seis mil médicos, a maioria em
Havana e que estes estavam, quase todos, dedicados ao exercício privado da
medicina. A expectativa de vida da população cubana era inferior a 60 anos e a
mortalidade infantil chegava ao absurdo patamar de sessenta para cada mil
nascidos vivos, à época, o país contava com apenas uma escola de medicina, fica
claro o avanço conseguido pelos revolucionários.
O modelo de saúde cubano teve
diferentes etapas. Na década de 1960, criou-se o Serviço Médico Rural, visto
que a população do campo não possuía cobertura médica à época do da Revolução,
iniciou-se então, um amplo programa de vacinação com a massiva participação da
sociedade. Na década de 1970, a docência médica foi desconcentrada e espalhada
por todas as províncias do país. Nos anos de 1980, foi estabelecido o modelo de
medicina familiar que constitui o pilar mais importante dos avanços na área;
iniciaram-se a introdução da tecnologia avançada e o desenvolvimento acelerado
da industria médico-farma-céutica. A partir dos anos de 1990, generaliza-se a
introdução dos avanços da ciência e da técnica na saúde.
Para uma população de pouco mais de
11 milhões de habitantes, distribuídos em 14 províncias e no município especial
Isla de la Juventud, Cuba conta com mais de 68.000 médicos, desses, 31.059 são
médicos da família, 81.459 enfermeiros, 10.000 dentistas e mais de 66.000
técnicos da saúde. Estudam no sistema nacional de saúde 49.707 pessoas, dos
quais 9.226 são estrangeiras de todos os continentes.
- Mais de 14.671 consultórios de médicos da família
- 445 policlínicos
-164 clínicas de odontologia
- 265 hospitais
- 13 institutos de pesquisa
- 22 faculdades de Medicina
- 645 outras instituições
Se no ano da Revolução Cubana, Cuba
contava apenas com uma Escola Médica e 6000 médicos, hoje conta com 70.594
médicos, dos quais 33.769 são médicos de família, com uma cobertura total do
território, sendo dado grande ênfase às zonas rurais.
Para isso, Cuba necessitou de
realizar um conjunto de reformas e investimentos, tendo priorizado a formação
de recursos humanos, em quantidade e qualidade, e a criação de uma rede de
Institutos e Faculdades, existindo hoje:
. 22 Faculdades de Medicina
. 1 Escola Latinoamericana de
Medicina com 12 Faculdades de Formação
. 4 Faculdades de Estomatologia
. 4 Faculdades de Enfermagem
. 4 Faculdades de Tecnologias da
Saúde
. 1 Escola Nacional de Saúde
Pública com 15 centros provinciais no país.
. 29 Faculdades para o programa de
formação de médicos latino-americanos.
. 245 Policlínicos universitários
Sendo que o número de estudantes
matriculados no sistema de formação ascende a 159.526, entre estes 149.123
cubanos e 10.403 de outros países.
Além do trabalho na própria ilha, o governo cubano
possui o projeto de médicos internacionalistas que, ao contrário de Brasil e
Estados Unidos que enviam militares a zonas de conflito e países pobres, envia
médicos na tentativa de sanar epidemias e amenizar os problemas, onde a
qualidade de vida é reduzida pela falta ou não existência de assistência
médica. Esse projeto teve início na década de 1960.
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Equipa médica, 6 Hospitais
Rurais
106000
unidades de sangue
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Equipa
médica e medicamentos
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União Soviética Chernobyl
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17733 crianças tratadas em
Cuba,
até
Outubro de 2004
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Brasil Exposição a radiação
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52
doentes tratados em Cuba
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América Central Furacão Mitch
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El Salvador Epidemia de Dengue
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10000 casos em 16 semanas.
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Equipa médica, equipamento
e aconselhamento
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Em 19 de Setembro de 2005, após a
catástrofe causada pelo Furacão Katrina em New Orleans, nos Estado Unidos, o
governo cubano criou o Contingente “Henry Reeve”, que atende situações de
grandes desastres naturais e epidemias. Composto por 10.000 médicos,
enfermeiros e graduandos do curso de Medicina, está hoje deslocado para o
Haiti, onde atende as vítimas do terremoto de Janeiro de 2010.
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75000
mortos, 3,3 milhões de desalojados
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2465 equipas médicas
32 hospitais de campo
(durante
7 meses)
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670 mortos, 300000 desalojados
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600 equipas médicas
e medicamentos
(3
meses)
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140 equipas médicas
20
hospitais de campo
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135 equipas médicas
2
hospitais de campo
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Os médicos internacionalistas
cubanos estão divididos entre vários programas pelo mundo na Argélia e a China,
por exemplo, Cuba realiza um intercâmbio de bens e serviços, mediante o envio
de 280 médicos para a Argélia e a construção de 9 centros oftalmológicos na
Argélia e 1 na China.
O Programa Integral de Saúde
realizado por profissionais cubanos, está presente hoje em 31 países com 2.777
colaboradores, onde 1.979 são médicos. Os 400 departamentos, em que existe esta
colaboração atingem uma população de 59.174.683 pessoas, sendo realizadas, nos
últimos 7 anos de cooperação, 80.285.750 consultas médicas, 2.152.479
intervenções cirúrgicas, e salvando-se 1.528.497 vidas.
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África Subsahariana (23 países)
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América Latina (5 países)
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Norte de África e Médio Oriente (1 país,
RASD)
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Ásia e Oceânía (6 países)
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Em 2004 o governo cubano criou um programa de
cooperação internacional chamado Operacíon Milagro na tentativa de reduzir os
problemas relacionados a visão em países que não têm a possibilidade de dar
cobertura nessa área à seus habitantes. Fazem parte desse projeto 239 médicos,
beneficiando gratuitamente 513.664 pacientes, destes 95.131 da América Latina,
24.797 do Caribe, 305.930 Venezuelanos e 97.806 cubanos. Também foram operados
425.858 doentes provenientes do resto do mundo. Além disso, foram criados 29
centros cirúrgicos de alta tecnologia em 6 países (12 na Venezuela, 11 na
Bolívia, 2 Equador, 1 na Guatemala, 2 no Haití e 1 em Honduras).
A parceria com Bolívia e Venezuela
se estende através do “Programa Especial com a Bolívia e a Venezuela”. No
“Plano Barrio Adientro”, da Venezuela, trabalham 24.464 cubanos, onde 13.153
são médicos, atuando em todo o país, com maior relevância às zonas rurais, onde
a assistência médica praticamente não havia. Na Bolívia, colaboram 1.607 cubanos,
destes 1.220 médicos, atuando nas 9 províncias do país, em 20 Centros de
Diagnóstico Integral doados por Cuba.
Fazendo jus ao lema cubano que diz
que solidariedade não é dividir o que nos sobra, mas o pouco que temos, os
cubanos garantem o melhor atendimento do mundo aos seus conterrâneos e ainda
fazem o mesmo trabalho em países que possuem dificuldades nessa área. Enquanto
conversava com Leticia, uma cubana que trabalhava conosco no acampamento, era
difícil explicar a ela que no Brasil pessoas morrem por falta de médicos, não
há pediatras suficientes para atender a todas as crianças, e que os doentes têm
de dormir nos corredores dos hospitais. Fácil de entender a sua incompreensão
quando analisamos os dados da medicina cubana, “como pode existir pessoas
dormindo em corredores no Brasil, um dos países mais ricos do mundo se em Cuba,
mesmo com todos os problemas econômicos isso não ocorre?” Encerro o texto com
esse questionamento, esperando que algum dia, possamos resolver os nossos
problemas como os cubanos conseguiram resolver os deles.
Pelo professor Eliton Felipe de Souza.