quarta-feira, 19 de agosto de 2009

A quelque chose malheur est bon

O deprimente bate boca entre os senadores teve pelo menos o mérito de trazer à tona o problema da necessidade ou não da existência do senado.

Esta custosíssima instituição não cumpre na verdade nenhuma função positiva na vida nacional. Sua atuação resume-se em frear toda e qualquer iniciativa progressista que porventura surja na Câmara de Deputados (é raro, mas às vezes, surge). Trata-se, portanto, de uma instituição reacionária.

O senado é uma invenção estadunidense. Está ligado à própria formação daquela nação – um acordo entre estados dotados de ampla autonomia, cada qual com uma burguesia próspera e ciente de sua liberdade.

Lá, portanto, a instituição tem sentido. Cumpre uma função relevante e é assim reconhecida por toda a população.

A nação brasileira não surgiu da união entre estados constituídos e dotados de vida própria. Pelo contrario, aqui foi a nação que criou os estados, a partir de capitanias hereditárias, das quais surgiram oligarquias que nada tinham (nem têm atualmente) de burguesias, mas tão somente de uma capa rentista que explorava um território doado pelo Rei - características estas que não se modificaram com o advento da República.

Nesse contexto, o senado é – e sempre foi – uma instituição postiça, sem um lugar legítimo na constituição do Estado brasileiro.

O argumento de que o senado assegura a equalização do peso dos estados e, portanto, opera como um instrumento importante para evitar que os estados populosos explorem os menos populosos não passa de um pretexto para perpetuar a presença das oligarquias das regiões mais atrasadas do país no cenário político. Isto apenas distorce todo o processo decisório e, como a experiência dos seus 167 anos de existência indica, bloqueia o avanço econômico, social, e político da nação.

Não há necessidade de senado algum para defender os interesses legítimos dos estados menos populosos. Várias fórmulas, como o Conselho Federativo proposto pela professora Dinorá Grotti, ou outras mencionadas na literatura jurídica, podem muito bem dar conta da tarefa, sem o enorme gasto que o senado representa.

Na verdade, basta uma comissão permanente para cumprir perfeitamente a função. Se a revelação das fraudes cometidas pelos senadores levar à extinção do órgão, podemos dizer, como os franceses, "a quelque chose malheur est bon".

Editorial do Correio da Cidadania
http://www.correiocidadania.com.br/content/view/3620/128/

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